segunda-feira, 18 de abril de 2011

Imagem negativa da velhice

Sou da mesma opinião que o conceito da velhice é, assim, uma construção social realizada em um contexto cultural e histórico específico. A velhice, então, se situaria no mesmo patamar da infância e da adolescência, de igual modo construções sociais dependentes de parâmetros socioculturais específicos em diferentes sociedades.

Se verificarmos há pouco tempo atrás a preocupação com a infância e a adolescência promoveu avanços significativos em relação tanto a redução da mortalidade infantil, quanto da violência. Não se tinha uma preocupação tão expressiva como a que se tem hoje, o próprio estado era omisso em relação tanto a mortalidade como a violência, principalmente de crianças menores. Indubitavelmente o fator econômico por sermos uma sociedade consumista favoreceu essa preocupação. Como a população era preponderantemente de jovens, houve o incentivo a esse debate, inclusive no meio publicitário sempre foi dito que comercial com crianças vendia mais. Já a questão do idoso foi relevado a segundo plano.

Toda concentração de esforços foi nesse sentido, o bom é o jovem, o investimento publicitário, os modelos utilizados eram todos idealizados em cima desse público. E as políticas públicas também seguiram nesse sentido. Existe toda uma preocupação em cima do atendimento das necessidades de crianças e adolescentes, porque sabem que qualquer ação ou omissão perversa será imediatamente combatida pela rede de proteção implantada. Ocorre que em relação ao Idoso isso ainda não foi feito, permanece essa construção do ultrapassado, fora de uso, desnecessário, etc... Não foram criadas ainda essa consciência da importância que a colaboração do idoso tem para o desenvolvimento de uma nação.

Acho que já está mais do que na hora de o pais acordar, enquanto há tempo, para a realidade. Está ocorrendo recém a primeira fase que é mais aquela velha história de combater as conseqüências do descaso, do abandono, ao invés de combater as suas causas. Construção de alguns asilos públicos, quando muito, apenas para abrigar os que tenham sido abandonados. Multiplicam-se os abrigos privados, sem fiscalização efetiva das condições, que servem apenas para abocanharem os míseros trocados das aposentadorias. Só não existem mais idosos abandonados justamente por isso, a aposentadoria dos mesmos que acabam sendo o sustento de muitas famílias que por isso mesmo os mantém na casa, também sendo explorados.

O Brasil tem que acordar para essa realidade enquanto há tempo, para evitar o que está ocorrendo com os países desenvolvidos, a exemplo do Canadá, que está realizando feiras no Brasil para atrair principalmente profissionais qualificados e com família com filhos, para irem trabalhar e fixar residência lá, pois o pais envelheceu e se descuidou do seu equilíbrio populacional. Quer dizer para resolverem o problema deles querem aumentar o nosso.

Praticamente todos os países que assumiram essa postura se deram mal. Simplesmente copiar modelos e aplicá-los sem levar em conta as características especificas da população quase sempre não acaba bem. A china tentou o controle de natalidade, hoje enfrenta sérios problemas de violência, devido à grande diferença no número de homens em relação a mulheres, pois como a cultura valoriza o filho homem em detrimento da filha mulher e cada casal só pode ter um filho, as filhas mulheres “acabavam não nascendo”. Esse controle de natalidade em vários países que tentam implantar, e que o Brasil parece ter copiado, ocorre o reverso do que o pretendido tentam incentivar a ter menos filhos para diminuir as despesas com as famílias pobres, porém o controle só da certo nas famílias de classe média e alta, que teriam justamente as condições de manter filhos. A redução efetivamente até pode ocorrer, mais em grau bem menor nas famílias humildes. Enquanto nas mais abastadas ela é bem mais significativa. E é ai que se acelera ainda mais o envelhecimento da população do pais a ponto de ele ter que apelar para a imigração. Esse é um dos grandes problemas que pode ocorrer no Brasil, o governo não consegue dar a educação e a qualificação para a classe humilde e a classe média e alta que poderiam investir em educação dos jovens tem poucos filhos. Ocorre que o pais necessita de Técnicos qualificados e a população de classe humilde não consegue se qualificar.

Para suprir essa falta ele poderia contar justamente com a qualificação do idoso, no entanto esse idoso está relevado a segundo plano.

Acho sim, que se o pais acordar e começar a valorizar, criar uma rede de proteção efetiva, com políticas públicas mais efetivas, com isso o próprio mercado ira acordar, pois ira se dar conta disso que o idoso tem um valor comercial, que está se tornando maioria, e alavancar a valorização da importância do idoso e a rede de proteção será mais efetiva.

QUILOMBO DA FAMILIA SILVA

Os direitos das comunidades quilombolas à propriedade de suas terras e à proteção de seus "modos de criar, fazer e viver" estão assegurados na Constituição Federal pelos artigos 215 e 216 e pelo artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Os procedimentos para a identificação e titulação das terras quilombolas são orientados por legislação federal e por legislações estaduais.

As legislações estaduais são seguidas quando a titulação é conduzida por um órgão do governo do estado. Em dezembro de 2009, sete estados contavam com normas próprias para a regularização das terras de quilombo: Espírito Santo, Pará, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e São Paulo.

Na esfera federal, o Incra é o órgão responsável por titular as terras de quilombo seguindo os procedimentos estabelecidos no Decreto Federal nº 4.887 de 2003 e na Instrução Normativa Incra nº 57 de 2009.

(caminho para reconhecimento do Quilombo)
http://www.cpisp.org.br/terras/html/comosetitula_caminho.asp




Ficha Resumo do Território
Nome da Terra Família Silva
Nome da(s) Comunidade(s) Família Silva
Município Porto Alegre
Unidade da Federação Rio Grande do Sul
População 12 famílias
Dimensão da Área Titulada 0,23024 hectares
Data da Outorga do Titulo 21/09/2009
Órgão Expedidor Incra
Título registrado em cartório sem informação
Existência de Novo Processo de Titulação Não
Data da Última Atualização 24/02/2011

COMUNIDADE: FAMÍLIA SILVA
Terra: Família Silva
Município/UF: Porto Alegre - RS
População: 12 famílias / 41 pessoas
Titulação: processo em andamento no INCRA
Considerado o maior quilombo urbano do Brasil, o território da comunidade quilombola
Família Silva possui uma área de 0,651 hectares (ou 6.510 metros quadrados) e encontra-se situado no bairro Três Figueira, uma área nobre da cidade de Porto Alegre.
Durante vários anos, a comunidade resistiu à especulação imobiliária e à pressão de
particulares que promoveram uma intensa disputa judicial contra os seus direitos. A disputa judicial gerou duas decisões favoráveis aos quilombolas que relatamos abaixo.
O processo de regularização desta terra foi iniciado pelo INCRA no ano de 2004. Em 26 de outubro de 2006, o Presidente da República assinou decreto declarando de interesse social a terra ocupada pela comunidade e autorizando o INCRA a proceder a desapropriação a fim de garantir os direitos territoriais da comunidade.
Em 17 de janeiro de 2007, o Incra entrou na Justiça Federal com quatro ações de
desapropriação, envolvendo quatro partes distintas da área da comunidade. No dia 19 de janeiro do mesmo ano, o juiz federal proferiu decisão concedendo a imissão provisória da posse do imóvel nas quatro ações, garantindo assim que a comunidade continuasse em sua terra.
Ação reivindicatória n.º 001/1.050538272-9
Em 02 de abril de 1998, particulares propuseram contra alguns quilombolas individualmente a Ação Reivindicatória n.º 001/1.050538272-9 na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul.
Em 10 de agosto de 1999, a ação foi julgada procedente em razão da revelia dos requeridos, ou seja, sem que os quilombolas se manifestassem ou contestassem a ação. Um mandado de imissão de posse foi expedido, determinando que os quilombolas deixassem a área, mas não foi cumprido.
Em 2005, os particulares voltaram a acionar a justiça, cobrando a execução da sentença proferida. Um novo mandado de reintegração de posse foi expedido em 1º de junho de 2005. Dois dias depois, esse mandado foi revogado mas logo em seguida, em 08 de junho de 2005, um outro mandado foi novamente expedido.
Para evitar o cumprimento dessa ordem, os quilombolas recorreram ao Tribunal de Justiça com um agravo de instrumento. Nessa iniciativa contaram com o apoio do Movimento Negro Unificado, entre outras organizações. Já o INCRA e a Fundação Cultural Palmares entraram com uma Ação de Manutenção de Posse na Justiça Federal. Além disso, o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul entrou com uma ação ordinária, visando à suspensão dessa decisão.
Tanto o recurso quanto a ação possessória foram julgados procedentes e a comunidade conquistou o direito de permanecer em sua terra até pelo menos a finalização do procedimento de titulação em andamento no INCRA. Em 03 de julho de 2006, o juiz determinou o arquivamento da ação.

Agravo do Instrumento n.º 70011999836
O Agravo de Instrumento n.º 70011999836 foi proposto pelos quilombolas contra os
particulares perante o Tribunal de Justiça do Estado, em 13 de junho de 2005, visando a suspensão do mandado de imissão de posse emitido no dia 08 de junho de 2005.

Em acórdão de 06 de setembro de 2005, o tribunal determinou que fosse sustada a
ordem de imissão de posse sob o argumento de que, entre dois interesses (um privado e um público), deve-se optar por preservar o bem maior que é o interesse público, coletivo e social (eventual quilombola urbano). O voto da desembargadora relatora sustenta:
"altamente litigiosa, portanto, a questão da posse fática sobre a área em questão e, entre os dois valores, ora em jogo, esta Câmara opta por preservar o bem maior, que é o interesse público, coletivo e social, dando provimento ao agravo, para sustar a ordem de imissão de posse, até que se perquira melhor sobre as questões que não ficaram bem esclarecidas e exigem de um Judiciário que deve, antes de tudo, preservar os valores constitucionais, mantendo-se o statu que que de fato inalterável".
O autor ação entrou com Embargos de Declaração, mas o Tribunal rejeitou os embargos.
Posteriormente, o autor entrou com um Recurso Especial no Superior Tribunal de Justiça. Em 26 de setembro de 2006, o Tribunal decidiu não conhecer o recurso. O autor entrou ainda com um Agravo Regimental, mas, em 30 de outubro de 2006, o Tribunal negou provimento a esse recurso. Dessa forma, o acórdão do Tribunal de Justiça continuou valendo.

Ação de Manutenção de Posse n.º 2005.71.00.020104-4
Visando também a garantia dos direitos territoriais da Comunidade Família Silva, o INCRA e a Fundação Cultural Palmares entraram, em 10 de junho de 2005, com a Ação de Manutenção de Posse n.º 2005.71.00.020104-4 na Justiça Federal.

Em 12 de julho de 2005, o juiz proferiu decisão liminar, determinando:
• reconhecer e assegurar provisoriamente a posse da Associação Comunitária Quilombo
Família Silva sobre a área discutida na ação;
• estabelecer aos réus que se abstivessem de reivindicar, turbar ou esbulhar a posse;
• ordenar aos réus que se abstivessem de adotar quaisquer providências, judiciais ou
extrajudiciais, que limitassem ou afetassem a posse da área por parte da associação, até o ulterior julgamento da presente ação ou a ultimação da titulação definitiva de que trata o art. 68 da ADCT da Constituição Federal; e
• fixar a multa diária de R$ 10.000,00, por dia, para cada réu que descumprir a decisão.
Como justificativa, o juiz sustenta que deferiu a proteção possessória pleiteada como forma de garantir o exercício do direito constitucional do art. 68 do ADCT da Constituição Federal, proteger o patrimônio cultural brasileiro e “assegurar proteção àqueles que há tanto tempo resistem e lutam pela própria sobrevivência, mesmo que às margens da ordem vigente e ao custo da própria sobrevivência, sem nunca terem perdido sua dignidade ou deixado de lutar por ela”.
Até abril de 2007, a ação ainda não havia sido julgada definitivamente.



AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO Nº 2007.71.00.001036-3/RS
AUTOR : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E
REFORMA AGRARIA - INCRA
ADVOGADO : LUCIANA DA COSTA JOB
RÉU : ALEXANDRE CORREA TORRES
: BEATRIZ HELENA COLLETTO TORRES
: GELSON MARCHI DE CARVALHO
: MARIA LUCIA ROSA ROSSETI
Despacho/Decisão
1- RELATÓRIO. Trata-se de ação de desapropriação por interesse social
entre as partes acima citadas, relativamente a imóvel urbano localizado no bairro
Três Figueiras em Porto Alegre. A área integraria o Quilombo "Associação
Comunitária Kilombo de Família Silva" para os fins do art. 68 do ADCT/88. O
imóvel está descrito na petição inicial e nos documentos que a acompanham. O
interesse social para fins de desapropriação foi declarado pelo Decreto de 26/10/06
(DOU-I de 27/10/06, p. 14). O relatório técnico de identificação, delimitação e
levantamento ocupacional e cartorial foi elaborado e aprovado pela Portaria 19, de
17/06/05 (DOU-I de 21/06/05, p. 59-61). O INCRA depositou o valor oferecido,
requerendo: (a) o processamento da ação na forma dos artigos 215 e 216 da CF/88,
do artigo 68 do ADCT/88, do Decreto 4.887/03, da Lei 4.132/62 e do Decreto-Lei
3.365/41, com a citação do réu e demais atos processuais cabíveis; (b) a imissão na
posse do imóvel mediante o depósito que efetuou (art. 15-§ 1º do DL 3.365/41); (c)
a determinação para que os valores previamente depositados fiquem bloqueados e à
disposição desse Juízo até que se resolva a questão de domínio que envolve a área,
conforme é discutido em outras ações judiciais; (d) a intervenção do Ministério
Público Federal; (e) a intimação da Fundação Cultural Palmares para ingressar na
qualidade de litisconsorte necessário. Há comprovação da realização do depósito em
conta vinculada à ordem desse Juízo. Vieram os autos conclusos. É o relatório.
Decido.
2- FUNDAMENTAÇÃO. Sobre o recebimento da petição inicial, a
argumentação do expropriante INCRA que consta da petição inicial é suficiente
para indicar que estão presentes os requisitos que autorizam o recebimento da
petição inicial de desapropriação e prosseguimento da desapropriação na forma
processual pretendida pelo expropriante (arts. 215-216 da CF/88; art. 68 do
ADCT/68; Decreto 4.887/03; Lei 4.132/62 e DL 3.365/41), até final julgamento da
ação. O rito a ser seguido é aquele da desapropriação por interesse social (previsto
na Lei 4.132/62), subsidiado pelas disposições do DL 3.365/41 naquilo que aquela
lei for omissa (art. 5º da Lei 4.132/62). O decreto de interesse social ainda não teve
seu prazo vencido (art. 3º da Lei 4.132/62) e foi antecedido dos estudos e
procedimentos prévios exigidos pela legislação vigente e em consonância com o art.
68 do ADCT/88 (Decreto 4.887/03). Por isso, recebo a petição inicial e determino
seu processamento, segundo o procedimento antes explicitado e desde que o
INCRA junte aos autos, em cinco dias, cópia atualizada da matrícula do imóvel
junto ao Registro de Imóveis. Determino ao INCRA que junte aos autos esse
documento, em cinco dias.
3- Sobre a imissão provisória na posse do imóvel, estão presentes os
requisitos do art. 15 do DL 3.365/41, aplicáveis por conta do art. 5º da Lei 4.132/62.
O depósito foi feito, segundo os critérios expostos na petição inicial e constantes da
legislação vigente. Ao que tudo indica, os expropriados não se encontram na posse
do imóvel desapropriado, que é ocupado pela própria comunidade quilombola. Por
isso, defiro a imissão provisória na posse do imóvel desapropriado em favor do
INCRA, garantindo aos integrantes da comunidade quilombola "Associação
Comunitária Kilombo de Família Silva" que permaneçam na área até agora
ocupada.
4- Sobre o bloqueio dos valores depositados, a legislação que trata da
desapropriação por interesse social prevê a possibilidade do valor depositado ser
levantado (arts. 33-34 do DL 3.365/41 e art. 5º da Lei 4.132/62). No caso dos autos,
entretanto, o expropriante alega que existiria uma ação em tramitação, discutindo a
propriedade da área. Entretanto, embora o art. 34 do DL 3.365/41 permita o
bloqueio ("se o juiz verificar que há dúvida fundada sobre o domínio, o preço ficará
em depósito, ressalvada aos interessados a ação própria para disputá-lo"), não há
prova nos autos da existência da referida ação alegada pelo expropriante em que se
discutiria o domínio. Não há indicação de qual seriam os termos da petição inicial
dessa ação anulatória, nem comprovação de sua atual fase processual. Por isso,
parece prudente da parte desse Juízo (para preservar o direito de ambas as partes)
relegar a discussão sobre a liberação de valores depositados para momento
posterior, observando então o disposto no art. 34 do DL 3.365/41 e com a
possibilidade de que o expropriante comprove a situação que autoriza a aplicação do
disposto no art. 34-§ único do DL 3.365/41. Por isso, relego para momento
posterior o exame do pedido do expropriante para bloqueio dos valores
depositados, ressaltando que não existem ainda elementos nos autos dessa ação de
desapropriação que permitam a esse Juízo "dúvida fundada sobre o domínio" (art.
34-§ único do DL 3.365/41) e ressalvando o exame da questão no momento
oportuno, se requerida a liberação de valores depositados na forma dos arts. 33-34
do DL 3.365/41.
5- Sobre a intervenção do Ministério Público Federal, discutindo a presente
ação questões pertinentes à desapropriação por interesse social e interesses de
comunidade quilombola, é conveniente assegurar a intervenção do Ministério
Público Federal. Por isso, intime-se o Ministério Público Federal para que fique
ciente da ação e, querendo, intervenha na condição de custos legis.
6- Sobre a intimação da Fundação Cultural Palmares para ingressar na
qualidade de litisconsórcio necessário, não parece ser o caso de litisconsorte
necessário. Isso porque o INCRA não defende nessa ação um interesse
exclusivamente próprio, mas também de terceiros (da comunidade quilombola),
buscando a regularização do direito do art. 68 do ADCT/88, tal como previsto no
art. 17 do Decreto 4.887/03: "a titulação prevista neste Decreto será reconhecida e
registrada mediante outorag de título coletivo e pró-indiviso às comunidades a que
se refere o art. 2º, caput, com obrigatória inserção de cláusula de inalienabilidade,
imprescritibilidade e impenhorabilidade". Então, não parece essencial a presença da
Fundação Cultural Palmares nessa ação de desapropriação, até porque os arts. 15 e
16 do Decreto 4.887/03 estabelecem dois momentos distintos de defesa dos
interesses da comunidade quilombola envolvida, conforme se tenha ou não o
respectivo título de propriedade já regularizado. O art. 15 do Decreto 4.887/03
estabelece que "durante o processo de titulação, o INCRA garantirá a defesa dos
interesses dos remanescentes das comunidades dos quilombos nas questões
surgidas em decorrência da titulação das suas terras" (grifou-se), enquanto o art.
16 do Decreto 4.887/03 estabelece que "após a expedição do título de
reconhecimento de domínio, a Fundação Cultural Palmares garantirá a assistência
jurídica, em todos os graus, aos remanescentes das comunidades dos quilombos
para defesa da posse contra esbulhos e turbações, para a proteção da integridade
territorial da área delimitada e sua utilização por terceiros, podendo firmar
convênios com outras entidades ou órgãos que prestem esta assistência" (grifouse).
Ou seja, durante o processo de titulação quem responde pela defesa dos
interesses da comunidade quilombola é o INCRA. A Fundação Cultural Palmares
assume essa função após a expedição do título de reconhecimento de domínio, que é
o que se busca nessa ação de desapropriação. Portanto, encontrando-se a
comunidade quilombola em fase de tramitação do processo de titulação (art. 15 do
Decreto 4.887/03) e não havendo ainda expedição do título de reconhecimento de
domínio (art. 16 do Decreto 4.887/03), que só ocorrerá após o término da presente
ação de desapropriação, não é necessária a intervenção da Fundação Cultural
Palmares como litisconsorte necessária. Por isso, indefiro o pedido de intimação
da Fundação Cultural Palmares como litisconsorte necessário.
7- DESPACHO. Para cumprimento do que foi decidido, determino:
(a) intime-se o INCRA para que fique ciente dos termos dessa decisão e
atenda o que foi determinado, em cinco dias (juntando certidão atualizada da
matrícula do imóvel), sob pena de indeferimento;
(b) após, juntada a certidão da matrícula, expeça-se mandado de imissão na
posse do imóvel, nos termos em que decidido;
(c) após, cite-se o expropriado para ficar ciente dessa decisão e para
contestar no prazo legal (arts. 16 a 20 do DL 3.365/41);
(d) após, feita a citação e decorrido o prazo de contestação, remetam-se ao
Ministério Público Federal para que fique ciente e requeira, em dez dias, o que
entender quanto à sua intervenção no processo;
(e) após, venham conclusos para oportunizar a réplica e a especificação de
provas, e para examinar eventuais requerimentos formulados pelas partes ou pelo
Ministério Público Federal.
Porto Alegre, 18 de janeiro de 2007.
Candido Alfredo Silva Leal Junior
Juiz Federal
23/03/2011 14:41:55
“No ano passado, no Brasil, aconteceram 55 mil assassinatos”, revela o advogado Onir de Araújo. Por hora, calcula ele, são 37 jovens assassinados, a maioria na faixa entre 14 a 25 anos e negros. Isso evidencia não só que o preconceito existe, e num nível alarmante, mas também que os negros vivem uma situação de pressão e intranquilidade bastante pesada. Em entrevista à IHU On-Line, realizada por telefone, Onir fala da situação degradante imposta pela Polícia Militar aos quilombolas moradores do Quilombo da Família Silva, localizada num bairro considerado zona nobre de Porto Alegre. “Isso culminou no dia de 25 de agosto, quando estava o presidente da associação e o neto dele ambos embaixo da placa do Incra, praticamente na entrada do territóri. O neto estava de velocípede, e os brigadianos já chegaram com armas em punho, rendendo e abordando”, denuncia.
Onir de Araújo é advogado e representa o Quilombo Família Silva. É também representante do Movimento Negro Unificado.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – O Quilombo Família Silva recebeu uma importante titulação no ano passado, reconhecendo suas terras. O que mudou de lá para cá?
Onir de Araújo – Existe agora uma segurança jurídica maior no que diz respeito à propriedade de território. Neste aspecto, é uma tranquilidade maior para a comunidade que, muitas vezes, trava lutas para o reconhecimento de seus direitos. O resultado de nossa resistência resultou, em 2005, na garantia da permanência dos quilombolas em um local que é o metro quadrado mais caro do Rio Grande do Sul. A titulação foi muito importante, não só devido ao nome da Família Silva, mas porque é referência nacional para a luta pelo espaço urbano, a partir de um referencial de povo negro. Este é, portanto, um marco. Só que continua o processo de luta para que eles tenham as condições dignas de viver ali. Ocorre que, apesar disto, a questão do olhar preconceituoso do próprio entorno e do próprio estado não vai acabar de uma hora para outra.
IHU On-Line – Quem está acuando o povo do quilombo dentro de seu próprio território?
Onir de Araújo – O que está acontecendo são abordagens abusivas e autoritárias feitas pela Polícia Militar em relação a membros da comunidade quando estão na praça, quando estão saindo ou chegando do trabalho o que vinha gerando bastante intranquilidade e insatisfação por parte da comunidade. Isso culminou no dia de 25 de agosto, quando estava o presidente da associação e o neto dele embaixo da placa do Incra, praticamente na entrada do território. O neto estava de velocípede, e os policiais já chegaram com armas em punho, rendendo e abordando. Naquele momento, um quilombola estava saindo do local para comprar carne, era mais ou menos umas 18h30min, e reclamou “é todo dia isso!”. O quilombola, indignado com as ameaças, retornou para o território, foi para casa e os dois policiais chamaram reforços e invadiram o quilombo, sem qualquer ordem judicial e entraram na casa dele, o agrediram, algemaram, espancaram com cassetete, na frente dos netos dele.
Eram quase 20 policiais, fortemente armados, que levaram o quilombola para o posto da Polícia Militar no 11º Batalhão. Quando o quilombo entrou em contato comigo, fui direto para a 8ª DP, onde fica a área judicial, onde ele deveria estar, mas não estava. Encontrei-o no Posto de Polícia e ele estava a praticamente uma hora ajoelhado, algemado, sofrendo ameaças. O entendimento da comunidade é que se caracteriza um olhar extremamente preconceituoso, racista em relação à comunidade. Muitos policiais, nas várias abordagens quando os quilombolas se identificavam como tal, “nós moramos ali, somos proprietários, somos quilombolas, somos moradores do bairro” eram ofendidos ouvindo que ali não era lugar de “vileiro”.
“A Polícia Militar tem que oferecer segurança não somente patrimonial, mas à vida, à integridade física ou moral, independente se a pessoa estiver cometendo um crime ou não”
A Polícia Militar tem que oferecer segurança não somente patrimonial, mas à vida, à integridade física ou moral, independente se a pessoa estiver cometendo um crime ou não. Sabemos que o olhar diferenciado do braço armado do estado, das polícias militares, é um olhar preconceituoso e racista em relação ao povo negro. Sabemos, pelos dados da ONU, que no ano passado no Brasil aconteceram 55 mil assassinatos, por hora são 37 jovens assassinados, a maioria na faixa entre 14 a 25 anos e negros. Essa situação toda gera um quadro de preocupação, na medida em que você não tem tranquilidade sequer para sair do seu local de moradia.

IHU On-Line – Há demandas relacionadas à segurança solicitadas pelo quilombolo, mas não atendidas?
Onir de Araújo – Existe uma demanda feita pela comunidade já há quatro anos que não foi atendida pelo governo que é do cerceamento da área, justamente para tirar o argumento que a Polícia Militar utiliza para invadir o quilombo. Os policiais afirmam que, como é uma área aberta, assaltos ocorrem no eixo da avenida Nilo Peçanha e os ladrões utilizam o território do quilombo para fugirem. Nós recebemos uma informação extraoficial por parte do Incra de que este muro seria feito agora, em regime de emergência, mas isso é sucessivamente dito, mas nunca é realizado.
Nós precisamos abordar esta discussão da segurança pública, de racismo institucional que os órgãos de segurança e repressão têm em relação ao bom negro e, em geral, em relação a luta do povo do Rio Grande do Sul. Nosso estado foi marcado, principalmente no ano passado, por um processo sucessivo de criminalização dos movimentos sociais. Tivemos o caso do assassinato do sem terra Elton Brum pela Polícia Militar, o que mostra a situação extremamente preocupante do órgão. Não podemos considerar normal esse tipo de ação da Polícia. Você não encararia como normal se um filho seu indo lhe visitar em casa, fosse toda hora abordado pela Polícia, sendo chutado, sendo ameaçado de lhe cercar de drogas ilícitas para criminalizá-lo, sendo algemado durante uma hora em plena via pública. Isso não pode ser considerado normal. Estatisticamente, você tem que considerar também que no bairro Três Figueiras os negros são a minoria da população, se no geral nós somos em torno de 22% no estado, ali no bairro nós não devemos chegar a 2% população total.
IHU On-Line – E como os outros moradores da região têm tratado os quilombolas?
Onir de Araújo – Quando estava no auge da questão da tentativa de despejo, havia torcida a favor da retirada da comunidade de lá para que saissemos da região. Mas a relação que se tem com a associação de moradores do bairro é extremamente cordial. É óbvio que existe um olhar de estranhamento por parte do entorno em relação à presença daquela comunidade negra ali. Lembro quando a Funasa fez um empreendimento de esgotamento sanitário nessa época da discussão do despejo. Quando chegaram os caminhões para fazer a obra, alguns vizinhos gritavam da janela “finalmente essa negrada vai ser tirada daqui”, mas era o caminhão de obra.
“Existe, por mais que não se queira, preconceito”
Existe, por mais que não se queira, preconceito. As pessoas encaram como um não-lugar para negros e pobres. Aquele lugar ali é para pessoas de classe média alta, ou até mais que isso, e não é normal se ter ali uma comunidade em que a maioria das pessoas seja negras, empregadas domésticas, jardineiros, por mais que sejam a mão de obra utilizada por boa parte dos condomínios para se manter os jardins, fazer a comida, limpar as latrinas. E agora tem essa situação criada pela Polícia Militar que gera mal estar para eles quando vão à praça, à padaria, à lanchonete, receberem parentes e assim por diante. Cria um mal estar. Além disso, o sonho de todas as grandes empresas imobiliárias é que ali tivesse quatro, cinco torres e, para isso, fizessem a “limpeza” da área” em relação a nossa presença lá. Mas o território é quilombola, está titulado e eles vão ter que respeitar a partir desta alteridade, reconhecida por lei.
IHU On-Line – De que forma as mudanças enfrentadas pelo município tiveram impacto para o Quilombo Família Silva?
Onir de Araújo – Muitas delas impactam negativamente. Geralmente o processo de urbanização do Brasil, Porto Alegre não é diferente disso, sempre é feita em detrimento da população negra e pobre. O areal da Baronesa e o Bonfim eram bairros onde viviam boa parte da população negra do estado do Rio Grande do Sul. O Parque da Redenção tem esse nome porque ali foi comemorado a Lei Áurea, e a libertação dos escravos. Toda essa região, os bairros Cidade Baixa, Bonfim, o eixo das avenidas Protásio Alves, Petrópolis e até a Nilo Peçanha eram regiões onde a presença negra era extremamente marcante. A aveninda Nilo era chamada de colônia africana de Porto Alegre, mas os processos de urbanização, a construção da perimetral, as aberturas de vias, sempre foram feitas em detrimento da população negra. No entanto, alguns nichos de resistência ficaram e hoje estão se organizando enquanto referenciais de luta ética quilombola pelo espaço territorial urbano. A questão quilombola hoje suscita essa discussão, tanto nos espaços urbanos como no mundo rural. Talvez esse seja o grande temor dos setores conservadores ligados ao grande capital imobiliário e que carregam um conteúdo de racismo extremamente grande.