sexta-feira, 7 de setembro de 2007

PORQUE O GOVERNO NÃO ACABOU COM A TORTURA NO BRASIL

Essa pergunta me foi feita por uma aguerrida militante de Direitos Humanos para ser publicada em um jornal de Açailândia no Maranhão, e como sempre defendi que os Defensores de Direitos Humanos usem ao máximo os Meios de Comunicação realmente comprometidos com a defesa da qualidade de vida de nossa população, faço questão de responder a essa indagação, mesmo que talvez ela não possa ser publicada pelos mais diversos motivos.
A questão é muito complexa, mas vou procurar sintetizar e descomplicar ao máximo para melhor entendimento. A Tortura existe desde os primórdios da nossa história, e consiste em alguém infringir sofrimento a outrem com determinado fim específico, obrigar o torturado a determinada atitude ou omissão de atitude, subserviência, ou mesmo por castigo. Já sob o aspecto da Legislação devemos estar atento a duas óticas, pela legislação Internacional, considerasse como tortura, apenas as efetivadas por uma autoridade pública, enquanto pela Brasileira, tanto faz se o agente torturador é público ou privado.
No Brasil o caso mais recente de combate a Tortura foi o lançamento do SOS Tortura, que na realidade deveria ser apenas um dos vários instrumentos da Campanha Nacional Permanente contra a Tortura, do qual fui Supervisor Nacional, tendo sido responsável pela parte operacional na implantação do Sistema
Em primeiro lugar o Projeto da Campanha Nacional Permanente Contra a Tortura é um excelente projeto, mas não foi de iniciativa do Governo Federal, ele foi elaborado por um conjunto de militantes de diversas entidades, e a parte que foi colocada em prática pelo Governo FHC, o foi por pressão conseguida pela Sociedade Civil com apoio de Organismos Internacionais, em especial com a visita do Relator da ONU, Nigel Rodley, ao Brasil.
Portanto é uma resposta a uma pressão, ou seja na realidade não houve aquela vontade Política de realmente acabar com o problema. Por isso mesmo só se preocupou com as aparências, colocando-se em prática primeiro aquilo que dava mais impacto na mídia, deixando o restante da campanha permanente para o futuro, que infelizmente ainda não chegou. Cabe ressaltar aqui que não sou contra o que foi implantado, nem muito menos critico o MNDH por ter feito a parceria, como muitos o fizeram, pelo contrario, deve-se parabenizar o reverendo Olmar Klinch, Coordenador do MNDH, pela coragem de aceitar o desafio mesmo sabendo dos riscos, pois naquele momento ou se aceitava as condições propostas, ou não se avançaria em nada, não só na questão da Tortura, mas em muitas outras áreas em que o Movimento evoluiu. E esse é o Grande mérito do SOS Tortura, mesmo com a extrema dificuldade financeira e todos os limites impingidos, hoje se tem um MNDH mais fortalecido e um combate a Tortura mesmo que discreto, a meu ver principalmente pela não implantação do restante da Campanha Permanente.
Por isso quando foram divulgados os primeiros dados do SOS Tortura, os representantes do Governo optaram pelo discurso mais fácil, de que quem mais Tortura nesse pais são Policias, Civis e Militares e Agentes Penitenciários, pois com isso delimita-se uma área menor e mais fácil de ao menos dar-se a impressão de se estar combatendo efetivamente o problema.
Na realidade os próprios números dos relatórios divulgados comprovavam que o problema é muito mais amplo e mais complexo que se imaginava, e infelizmente ainda se imagina.
Para cada caso Denunciado, tem-se pelo menos mais três que chegam a ligar, mas infelizmente não denunciam, isto comprovado em relatórios do sistema, sem falar dos que simplesmente nem sabem que o serviço existe, devido a deficiência de divulgação da campanha, que como disse foi de parte do Governo “para Inglês ver”.
Infelizmente quando se tem um problema complexo dessa envergadura, sempre se usa o discurso fácil, do tipo “O problema é a Legislação, vamos mudá-la”, e por ai a fora. Ai criasse uma Lei qualquer e ganhasse mais tempo. Falta o principal a meu ver, a vontade política de efetivamente se colocar em prática o que já se dispõe, e se investir e muito em Educação e Cultura.
Como se vê no perfil das vítimas, em caso da Tortura Institucional, a principal vítima é homem negro ou pardo, com baixo poder aquisitivo e pouquíssimo grau de instrução, e no caso da Tortura Privada, mulher e criança negra ou parda, baixo poder aquisitivo e baixíssimo nível de instrução.
Como se vê as grandes vítimas desse crime estão na base da pirâmide social, com pouca ou quase nenhuma força de pressão, a menos que se organizem e articulem em torno dos movimentos de Base da Sociedade e cobrem uma posição de enfrentamento do problema para os detentores do poder.
Para se Ter uma idéia em uma pesquisa entre Universitários, mais da metade dos entrevistados aceitam a tortura como forma de investigação, e um número maior ainda é a favor da dissolução do Congresso Nacional, o que realmente é muito preocupante.
Para se acabar com o problema da Tortura e com outras forma de agressão aos Direitos Humanos existem três soluções:
EDUCAÇÃO
EDUCAÇÃO
EDUCAÇÃO.

Brasília, 15 de junho de 2003.


Adm. Ervino R. Martins
Coord. Proj. FNEDH